Senhor ministro, o que falta?
Senhor ministro, o que falta? |
Trata-se, sem dúvida, do mais claro posicionamento deste
governo sobre o tema até o dia de hoje [ver
aquia íntegra do discurso do ministro].
A cobertura da grande mídia sobre a abertura do Congresso da
Abert, por óbvio, optou por destacar a “flexibilização” do horário de
transmissão da Voz do Brasil e as garantias sobre a “liberdade da
imprensa” – como se ela estivesse sob constante ameaça. Uma leitura isenta do
pronunciamento do ministro as Comunicações, todavia, não poderá ignorar que,
além das reiterações de praxe sobre o respeito à liberdade de expressão e a
ausência de incompatibilidade entre regulação e democracia, estão lá as
seguintes afirmações:
1.A questão de um marco regulatório para as comunicações no
Brasil se transformou em questão de “bom senso”:
“Quanto à necessidade de regulação, ou de atualização das
leis que regem a comunicação no Brasil, minha expectativa é de que o tema
avance e ganhe apoio rapidamente, até por questão de bom senso”;
2.A legislação do setor está totalmente defasada e as normas
e princípios constitucionais sobre o assunto não foram regulamentadas:
“O rádio e a televisão são regulados por uma Lei que
completa meio século de vida em 27 de agosto próximo. Se não bastasse, a
Constituição de 1988 prevê que questões como a programação local e independente
ou o estímulo à cultura regional sejam regulamentadas. E até hoje inexiste
qualquer lei que discipline como isso deve ser feito”;
3.Não deve surpreender, portanto, que exista uma série de
questões concorrenciais, jurídicas e estratégicas que não encontra resposta no
quadro legal existente. Alguns exemplos:
“A regra que obriga o controle de empresas jornalísticas por
capital brasileiro vale para a internet? As empresas que vendem conteúdos
online ou em televisores conectados devem ser submetidas a regras semelhantes
às da TV paga ou radiodifusão? O que deve ser feito para que o audiovisual
brasileiro continue a ser produzido e veiculado em um mercado no qual a
infraestrutura e os serviços estão em mãos de grandes empresas multinacionais?
Como se pode garantir a livre circulação de conteúdos e a pluralidade de fontes
de informação em um mercado que tende à concentração, como é o caso das
telecomunicações ou dos gigantes da Internet? Quais devem ser os mecanismos
para que o Brasil continue a contar com um ambiente jurídico e normativo que
permita, no longo prazo, que empresas continuem a prestar serviços gratuitos,
como é o caso atual do rádio e da televisão?”;
Acesso plural
4.A possibilidade de avanços na normatização do setor chegou
ao limite. Não há como prosseguir sem um novo marco regulatório:
“Com a modernização do Regulamento de Serviços de
Radiodifusão (…) chegaremos ao limite dos avanços infralegais que podem ser
feitos no atual ambiente regulatório das comunicações. Para irmos além,
precisamos de uma nova Lei – e não podemos esperar que o rádio e a televisão
sejam substituídos pela Internet para dar início à sua formulação”;
5.Os objetivos de uma Lei Geral proposta pelo Executivo não
incluem a prática do jornalismo e, portanto, não se aplicarão a jornais e
revistas. São eles:
“(a) regulamentar os artigos constitucionais relativos à
comunicação eletrônica,(b) modernizar as regras provadamente defasadas e (c)
possibilitar o tratamento à convergência tecnológica”;
6.A ausência de interferência do Estado (liberdade negativa)
não é garantia da liberdade de expressão. É necessário que o cidadão comum
tenha também garantidos seu direito de acesso à informação e às tecnologias que
“mediam” o debate público:
“Abominamos a censura ou o que se chamou de “controle sobre
a mídia”. Do mesmo modo, sabemos que o pleno exercício das liberdades
individuais vai muito além da não interferência do Estado nas atividades
jornalísticas. Ele passa pelo acesso dos cidadãos às variadas fontes de
informação e meios de comunicação”.
Questão premente
A nota à imprensa divulgada pela Abert ao término do seu 26º
Congresso fala em “resultados altamente positivos” e destaca especificamente “a
garantia do governo, através do ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, de
que o novo marco
legal da comunicação eletrônica será fruto de diálogo com toda a sociedade e
que seu conteúdo respeitará os princípios de liberdade de expressão e de
imprensa, sem impor qualquer tipo de controle sobre os veículos de comunicação
no país” (ver
aqui a íntegra da nota).
Nas últimas semanas, setores impermeáveis até mesmo ao
debate sobre um marco regulatório para as comunicações têm feito declarações
reconhecendo a necessidade de uma proposta legal e de sua discussão pública.
Diante desses fatos, reaparece a incontornável questão: o
que impede o governo da presidente Dilma de colocar em debate uma proposta de
regulação para setor de comunicações?
Senhor ministro, o que falta?
Por Venício A. de Lima (jornalista, professor aposentado da
UnB e autor de, entre outros livros, de Política de Comunicações: um balanço
dos Governos Lula (2003-2010), Editora Publisher Brasil, 2012), para o Observatório da Imprensa
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